11 fevereiro, 2010

Mulheres Prisioneiras do Passado

A experiência clínica de qualquer psicoterapeuta mostra a realidade de um fato:o sofrimento que acomete principalmente mulheres solitárias, as quais um dia já foram felizes em seus relacionamentos passados e que, devido à semelhança dos sintomas, comuns a todas elas, configuram uma síndrome que, neste trabalho deliberei, por suas características, denominar de Síndrome da Mulher de Ló.

A palavra síndrome, proveniente do greco síndromé, significa “reunião de sinais e sintomas que ocorrem em conjunto e que caracterizam uma doença ou uma perturbação”.


Mas por que Síndrome da Mulher de Ló?


Não existe uma razão intrínseca, a não ser a analogia que encontrei entre os sintomas dessas mulheres, e a tragédia retirada da história hebraica antiga, e que se resume no texto que encima esta introdução, a qual se abateu sobre a esposa de Ló, sobrinho de Abraão, o patriarca da nação israelita.


A história, que se acha registrada no capítulo 19 do Gênesis, normalmente é interpretada em seu sentido teológico. Neste texto, porém, irei abstrair dela apenas o seu sentido simbólico, metafórico, para fazer uma correlação com os sintomas que acometem as mulheres solitárias, sobre os quais adiante irei tratar.


Entretanto, para aqueles que não conhecem a história, acho bastante conveniente relatá-la aqui, embora de maneira resumida, para que possamos prosseguir com um correto entendimento do assunto.
“Tudo começou com uma querela entre os pastores de Abraão e os pastores de seu sobrinho Ló, os quais começaram a disputar entre si o espaço para a pastagem de seus respectivos rebanhos”.

Abraão, descontente com essa discórdia, propôs uma divisão de terras e deu a seu sobrinho a chance de escolher em primeiro lugar, com qual parte delas desejava ficar.


Ló, ao contemplar de longe o panorama que se lhe apresentava, notou que um lugar conhecido como “as campinas do Jordão”, era todo bem regado e para lá resolveu mudar-se, instalando-se na cidade de Sodoma, tornando-se ali um estrangeiro respeitado e bem - sucedido.
A história prossegue, narrando que Sodoma, assim como a vizinha Gomorra eram cidades corrompidas, nas quais proliferavam a promiscuidade sexual, em especial o homossexualismo, razão pela qual Jeová resolveu destruí-las, uma vez que sua maldade tornara-se insuportável.

No entanto, antes que isso acontecesse, enviou dois anjos, com aparência de homens, para livrar Ló e sua família da destruição.
Esses homens foram recebidos por Ló e acolhidos por ele debaixo de seu teto, para passarem a noite.

Porém, os homens da cidade vieram bater à porta da casa, exigindo que os anjos fossem colocados para fora, a fim de serem sexualmente abusados por eles.
Como Ló se recusasse a atender a tal pedido, os homens enfurecidos, quiseram abusar do próprio Ló, ocasião em que os anjos intervieram e feriram os habitantes da cidade de cegueira.

A partir desse momento, os anjos começaram a instar Ló e sua família para que saíssem rapidamente da cidade, antes do amanhecer, pois iriam destruir o lugar e não poderiam fazê-lo antes que Ló e sua família fossem dali retirados.


Como se demorassem, os anjos pegaram pelas mãos Ló, sua esposa e suas filhas e praticamente os obrigaram a sair o mais rápido possível, não antes, porém, de dar-lhes uma severa advertência, para que não olhassem para trás.


Assim, tão logo Ló, sua esposa e suas duas filhas saíram de Sodoma, os anjos começaram a destruir as cidades, com fogo e enxofre.
Todos obedeceram a ordem expressa dos anjos, exceto a mulher de Ló, que, por alguma motivação interior, olhou para trás e, como castigo, foi imediatamente convertida numa estátua de sal.”

Como você pode observar, aí está o motivo para a escolha do nome: Síndrome da Mulher de Ló – o seu conteúdo metafórico, em dois sentidos.


O primeiro, de olhar para trás, com seu óbvio significado de ficar presa ao passado, sentir pena do que foi deixado, ter curiosidade pela destruição daquilo que ficou, manter o coração na antiga vida, ater-se a bens que não existem mais, perder a antiga condição de abastança e tantos outros que aqui poderíamos enumerar.


O segundo refere-se à própria natureza de sua punição: ser convertida numa estátua de sal, ou seja, ficar petrificada, engessada, ossificada, cristalizada – uma situação que lembra completa imobilidade, total ausência de movimento e vida.


Tal é o que ocorre também, simbolicamente, com as mulheres que sofrem da Síndrome da Mulher de Ló.
Via de regra, são mulheres que já foram felizes ou experimentaram o amor em algum momento de suas vidas.

Mas, infelizmente, sofreram uma grande decepção por parte da pessoa amada de tal maneira que vieram a engessar; ou, em outras palavras, congelar suas emoções, tornando-se vítimas do medo.


Não daquele medo que é normal e que constitui a vivência de um período de luto até necessário para quem sofre uma grande frustração ou uma grande perda.
Mas um medo descomunal, desproporcional e completamente mórbido de sequer cogitar o abrir-se para um novo relacionamento, embora, no íntimo, até preferissem isso, se tivessem a capacidade perdida de o desejar.

Esse medo mórbido é filho do sofrimento, típico de pessoas maltratadas pela vida, desprovidas de ilusão, frustradas em seus sonhos passados; ou ainda chorando por um relacionamento que já acabou, que já foi destruído, que já não existe mais, que está morto e enterrado.


Mas que, a despeito de meses, anos ou décadas decorridos, continua sendo motivo de constante derramamento de lágrimas, tornando, assim inviável, a felicidade que ainda poderia existir, se esse sofrimento todo pudesse ser debelado.


E o que é ainda pior: a síndrome é ainda complementada por toda sorte de sentimentos negativos e contraditórios que são experienciados: culpa, raiva, rancor, autodepreciação, inconformismo, desejo de vingança, indiferença forjada, instabilidade emocional, extrema irritação e, conforme já referido, falta de perspectivas.


Entretanto, como não poderia deixar de ser, está claro que tais pessoas estão simplesmente dificultando as coisas, com o objetivo inconsciente de evitar um temido novo envolvimento, utilizando-se, para isso, de expedientes que são apenas os “sintomas” que escondem o medo irracional de se envolverem emocionalmente e de "correrem o risco" de serem felizes outra vez!

Trata-se, na verdade, de um “autoboicote”.

Necessário se faz, portanto, que mulheres portadoras da "Síndrome da Mulher de Ló" comecem a perceber que a perspectiva de vida que escolheram viver é apenas um mecanismo de defesa que não as levará a lugar nenhum.

Somente essa percepção realística as fará sair da paralisação emocional.

Ela poderá significar o abandono de uma posição considerada "segura" e o atrever-se a ir em busca de algo que poderá parecer ameaçador, uma vez que vislumbrar a chance de poder ser feliz outra vez pode parecer de fato um risco.

Todavia, um risco que valerá toda a pena.

Para essas mulheres, deixo como reflexão, o texto a seguir:

Arriscar é Viver "Rir é arriscar-se a parecer louco.
Chorar é arriscar-se a parecer sentimental.

Estender a mão para o outro é arriscar-se a se envolver.
Expor seus sentimentos é arriscar a expor seu eu verdadeiro.

Amar é arriscar-se a não ser amado.

Expor suas idéias e sonhos ao público é arriscar-se a perder.

Viver é arriscar-se a morrer.

Ter esperança é arriscar-se a sofrer decepção.

Tentar é arriscar-se a falhar.

Mas...é preciso correr riscos.
Porque o maior azar da vida é não arriscar nada...

Pessoas que não arriscam, que nada fazem, nada são.

Podem estar evitando o sofrimento e a tristeza.

Mas assim não podem aprender, sentir, crescer,
mudar, viver...
Acorrentadas às suas atitudes, são escravas;

Abrem mão de sua liberdade.
Só a pessoa que se arrisca é livre...

Arriscar-se é perder o pé por algum tempo...
Não arriscar é
perder a vida..."

(Soren Kierkegaard)


Tony Ayres

8 comentários:

  1. Excelente artigo , linguagem clara de facil compreensão. Realmente conheço muitas mulheres que estão presas ao passado.. Sofrer jamais .abraços Isma

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  2. Antonio,

    Passei aqui para conhecer seu blog...

    A mulher de Ló teve a oportunidade de mudar de vida, deixar o seu passado para trás, mas desperdiçou o livramento e a grande chance que Deus lhe deu... deixou-se atrair pelo passado. Muitas mulheres realmente estão com essa síndrome da mulher de Ló, ao invés de avançarem...retrocedem... param no tempo, não progridem...não percebem que a vida continua, e que jamais poderão fazer o tempo voltar.
    Que muitas mulheres feridas leiam esse post e avancem... mesmo que haja obstáculos, sigam em frente...e que recebam um ânimo novo, vindo do Pai das luzes!

    “...não sou ainda tudo quanto deveria ser, porém estou concentrando todas as minhas energias para insistir nesta única coisa: esquecendo o passado e aguardando esperançoso aquilo que está à frente, esforçando-me para chegar ao fim da corrida e receber o prêmio para o qual Deus está nos chamando ao céu, em virtude do que Cristo Jesus fez por nós". Filipenses 3:13-14


    Shalom

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  3. Tenho 49 anos minha esposa 47 nosso casamento esta em crise esta muito forte a idea da ceparaçaõ

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  4. Prezado Anônimo:

    A separação de um casal é uma experiência muito dolorosa, tanto para os cônjuges, quanto para os filhos. Se as coisas não vão bem em seu casamento não existem somente as opções: separar-se ou viver infeliz para sempre.

    Procure a ajuda de uma pessoa cristã reconhecidamente sábia e faça todos os esforços para não jogar fora tudo o que você e sua esposa construíram juntos.

    Vocês ainda podem ser felizes juntos.

    Boa sorte!

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  5. Eu estava passeando pela internet em busca de um texto, um vídeo-palestra acerca dos sentimentos femininos. Pois bem,isto para que eu pudesse ter um melhor endendimento da pscicologia de minha namorada.Pois consegui aos poucos e com cautala saber um pouco de seu passado AMOROSO, fiquei sabendo atravéz da própria, que ela teve um namorado, noivou e este lhe traiu deixando-a profundamente magoada, passando-a a viver somente para os estudos ao longo de um pouco mais de uma décado sem ter namorado, sem confiar em mais ninguém. Atraves destes fatos é que eu percebi a grande dificuldade que ela tem em ouvir de mim palavras de amor, frases de amor, presentes, etc. Percebo que ela tem medo, sinto que ela acha que tudo faço é virtual, não existe, que eu não tenho amor por ela, ou seja, ela não confia e ao mesmo tempo não quer me perder. O seu estudo sobre A SINDROME DA MULHER DE LÓ veio a mim como um grande socorro, eu imaginava que eu estava errado, ou que eu estava magoando-a. tenho total paciencia com ela, ela é muito importante para mim. Vou tentar explorar dela as angustias passadas, para que ela se liberte e sinta-se melhor, e que ela se sinta segura comigo. Obrigado Tony Ayres, você me deu uma grande ajuda.

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  6. Prezado anônimo:

    A sua atitude, sem dúvida, há de ser um estímulo para a sua namorada.

    Boa sorte!

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  7. Dr. Antônio Ayres, uma dúvida, sempre que há estímulo, quando tudo está indo bem, tudo dando certo, de repente ela desmancha tudo, não acredita em mim, diz que eu não há amo ou que eu estou me aproveitando dela, isto é normal de quem sofre desta sindrome? Então, tento, tudo de novo convencê-la de minhas atitudes e palavras. Sou Professor aqui em Fortaleza, Prof. L. Gurgel.

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  8. ao me deparar com este estudo , fique curiosa em saber mais profundo sobre a tireoide, esta doença é emocional? me explique melhor sobre este assunto.

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